Jojo sofreu a vida inteira.
Viveu anos em uma caixa de madeira, sem ver a luz do sol, em um lugar horroroso. Perdeu ninhadas e mais ninhadas. Chegou em um estado deplorável na ONG, muito arisca e assustada.
Foi adotada após um ano e devolvida um mês mais tarde, porque quebrou um vaso.
Lembro até hoje do dia em que fui buscá-la na antiga casa e da dor que senti por ter falhado. Lembro da sua carinha de pânico, me olhando pelas grades da caixa de transporte e da falta de coragem de deixá-la no abrigo de novo.
Foi assim que ela chegou à nossa família e me deu o privilégio de amá-la incondicionalmente.
Aí vieram os diagnósticos da surdez, do megaesôfago e da FIV. Descobrimos que sua vida seria curta, mas ela nunca viu isso como um problema.
Depois vieram o tumor na orofaringe, o sopro no coração, o câncer, a hemobartonelose e, o golpe de misericórdia, a pneumonia.
Foi muita coisa junta, até para uma guerreirinha como ela.
Agora Jojo está livre da dor, dos tubos, das injeções e dos remédios que tanto odiava. Passou, não dói mais nada. Dói apenas em mim, que tenho um buraco no peito e o coração despedaçado.
O que fazer com tanta saudade?
Saudade dela miando rabugenta, pedindo atenção. Saudade dela empinando o bumbum para receber carinho. Saudade dela dormindo no meu colo ou no meu travesseiro. Saudade dos gritinhos felizes, cada vez que ela via o potinho de sachê. Saudade dos olhinhos profundos, sempre me olhando com tanto amor. Saudade até dos grunhidos malucos, no meio da madrugada.
E a saudade da Pi? Como explicar essa saudade, que ela ainda nem sentiu?
Saudade também pela Lily, que não teve a chance de conhecer a gata mais especial do mundo.
Fico pensando o que fiz de errado, o que poderia ter feito diferente, o que faltou.
Mas a verdade é que já entrei nessa batalha sabendo que iria perder. Difícil é explicar essas coisas para o coração. O meu desaprendeu a bater longe do dela e insiste em sangrar.
Como conseguir dormir de agora em diante? Como reunir forças para me despedir?
Eram dois meses iniciais. Foram três anos. E nunca, nunca terá sido tempo suficiente.
Brilha, milagrinho, brilha…
Te amo para sempre.
