Farofa foi abandonada já idosa, em um hospital veterinário para eutanásia, quando seu dono descobriu que ela tinha FIV. Dizem que ele nem olhou para trás, sequer se despediu.
Ela veio para cá escondida, roubada da clínica e, aos poucos, fomos descobrindo que além da AIDS, era muda, tinha problemas renais, fígado e baço comprometidos, dentes podres e vários tiros de chumbinho pelo corpo.
Mas nada doía mais do que a tristeza em seu olhar.
Farofa nunca superou o abandono, nesses oito meses em que esteve aqui. Vivia escondida, tinha medo de tudo, subiu ao meu lado no sofá pouquíssimas vezes e, mesmo assim, sem se deixar tocar.
Após meses de homeopatia, passou a me seguir, de longe, pela casa. Foi o máximo de amor que consegui extrair dela.
Por isso, quando descobrimos um câncer avassalador em seu rim na semana passada, eu já sabia qual seria o final dessa história.
Farofa desistiu de viver. Em nenhum momento lutou, esboçou reação ou se esforçou pela recuperação. Mais do que a FIV, o câncer ou a doença renal crônica, o que levou minha filhota foi a tristeza.
Agora estou aqui, com o coração apertado, doendo de saudade e com uma sensação de impotência que não cabe em mim. Sinto por ter falhado, por ver o estrago do abandono tão de perto, por ter dado meu melhor para que ela fosse feliz e ainda assim não ter sido suficiente.
Porém, pior do que tudo isso, é a dor da culpa.
Os profissionais do hospital veterinário no qual ela ficou internada esses dias falharam em inúmeros pontos, foram negligentes, incompetentes e profundamente insensíveis. Mas nada, nada machuca mais do que terem me negado a oportunidade de me despedir da minha filhota. Não há consolo, não há desculpa, nem explicação.
Farofa morreu sozinha, em uma gaiola, sem carinho, nem conforto, justamente como tentei evitar que acontecesse há exatos oito meses.
Como me perdoar por isso?
Como esquecer?
Como acalmar o coração?
Brilha, minha estrelinha, brilha forte.
Espero que agora vc possa ser feliz.
Te amo para sempre.
