Catarina foi resgatada de um bueiro há quatro meses, já cega, banguela, com mais de 14 anos, pancreatite crônica, lipidose, problemas intestinais, renais, AIDS e PIF.
Ficou três meses internada e teve alta para passar seus últimos dias em casa. O que ninguém esperava é que esses “últimos dias” seriam quarenta.
Catarina era uma guerreira, lutou até o fim para viver. Ontem de madrugada, comeu, usou a caixinha, esperou pacientemente que eu limpasse seus olhos e pediu carinho.
Dei o costumeiro beijo de boa noite distraída, sem imaginar que seria nosso último. Se arrependimento matasse, hoje eu estaria sendo enterrada no lugar dela.
Se soubesse que essa noite seria a nossa despedida, teria ficado ali, deitada ao seu lado. Teria beijado mais, abraçado mais, amado mais.
Infelizmente, não deu tempo.
Catarina amanheceu convulsionando e com problemas respiratórios. Após algumas horas de terror absoluto, tive que escolher deixá-la partir. Não seria justo continuar prendendo meu fiapinho àquele corpo doente, apenas porque eu não estava preparada para dizer adeus .
Perder duas filhas em menos de vinte e quatro horas, durante a gravidez é avassalador. Dói no fundo da alma. Estou com um buraco no peito, sem reação, nem forças para levantar.
Mas essa história não é sobre mim, minha tristeza, minhas frustrações ou arrependimentos.
Essa história é sobre a gata mais aguerrida que já conheci. Um fiapinho que me ensinou em poucos meses muito além do que aprendi a vida inteira sobre força de vontade, amor incondicional e gratidão.
É sobre fazer o que é certo: estender a mão para um bichinho que morreria em poucas horas dentro de um bueiro, com fome e frio, para lhe dar a merecida dignidade e mostrar, ainda que no apagar das luzes, que as coisas podem ser diferentes.
É sobre o triste final da nossa batalha juntas.
Hoje minha filhota descansou.
De tudo que passamos, ficam apenas a saudade, o amor infinito e uma certeza: cada segundo valeu a pena. Eu a escolheria mil vezes de novo, de novo e de novo, se tivesse a chance.
Cata-linda foi um verdadeiro presente. Pena que não terei a oportunidade de agradecer a altura.
Brilha, meu amor.
Brilha que o meu céu é todo seu.
Te amo para sempre.